Sobre a estética corporal
REINALDO SAMPAIO PEREIRA
O termo estética é derivado do termo grego aisthetes que, por sua vez, é derivado de aisthesis. O termo aisthesis, assim como outros tantos termos, assume uma pluralidade de significados – fenômeno esse bem comum não apenas à língua portuguesa. Um dos significados de aisthesis é sensação, a ação de sentir. Aisthesis, primeiramente, não possui apelo à racionalidade, mas é um termo para designar a apreensão de um objeto ou de alguma coisa qualquer pelos sentidos. Estética é um termo grego para designar algo para o qual os gregos, em grande medida, voltavam a sua atenção, a saber, para um certo modo de percepção das coisas, dos objetos.
A Filosofia possui uma disciplina denominada Estética, a qual é a disciplina que trata acerca do belo e do feio, uma disciplina que tem como propósito avaliar as obras de arte, atribuindo a elas valores de belo ou de feio. A preocupação com a estética, nesse sentido, é extremamente antiga – os gregos já a possuíam. Ela é própria à Filosofia e não tão-somente ao senso comum. Os gregos, de modo geral e de maneira um tanto acentuada, preocupavam-se com o belo, tanto no que diz respeito às ações – nesse sentido, da perspectiva ética, buscava-se as belas ações –, quanto no concernente à beleza da arquitetura – a respeito da qual tratamos no livro Griffespaços –, ou então no que diz respeito à beleza do corpo. Podemos pensar a estética de várias perspectivas distintas. Cabe, aqui, examiná-la da perspectiva de certa configuração do corpo humano, isto é, da estética corporal, portanto sobre como percebemos – sobretudo através da visão – o corpo, sobre como voltamos o olhar para o corpo.
A preocupação estética com o corpo, similar à preocupação estética de modo geral, também não é uma preocupação tardia, exclusivamente moderna. Os gregos eram cultores do corpo e a prática de se exercitar era uma prática comum, seja para a guerra, em pesados exercícios – como era muito próprio à educação de algumas póleis gregas, sobretudo a espartana –, seja nas academias, visando a boa saúde, seja com finalidade estética. A finalidade estética não era, de modo geral, um fim em si para o grego, mas a preocupação estética visava um fim ulterior, um certo bem viver, pois não passava desapercebido ao olhar do homem grego que o belo é motivador de um certo bem-estar. A preocupação com o corpo, nesse sentido, é primeiramente uma preocupação estética, deslizando para a ética. Por isso a estética do corpo já merece análise cuidadosa quando se trata da Grécia antiga, mas não apenas nesse período e em relação a essa sociedade a preocupação com a análise da estética corporal se faz necessária. Pelos motivos apontados e por diversos outros, a preocupação com a estética corporal é merecedora de cuidadosos estudos também hoje.
Como é comum acontecer, de modo geral, as diversas sociedades, em épocas distintas, adotam certos padrões estéticos, padrões esses muitas vezes determinantes da inserção ou exclusão de algumas pessoas em alguns grupos, da valorização ou discriminação de algumas pessoas, ou até mesmo de um olhar de admiração ou de pena em relação ao outro. Essas determinações podem afetar, e profundamente, o cotidiano de muitas pessoas, determinando rotinas, afazeres, abdicação de prazeres, adoção de comportamentos, até mesmo conduzindo à morte algumas pessoas, como a imprensa brasileira noticiou recentemente casos de meninas que chegaram a falecer ou tiveram graves problemas de saúde por causa de anorexia gerada por excessiva preocupação estética em relação ao corpo.
A análise fria, distante, meramente estética pode nos mostrar que, a rigor, belo e feio não são atributos das coisas, assim como as cores, o formato, as dimensões, o sabor, etc. Isso significa que sobre uma cor, por exemplo o azul – salvo qualquer distúrbio visual, como o daltonismo –, se questionarmos – a respeito de qual cor se trata – duas pessoas, por mais que tenham experiências de vida distintas e sejam de culturas e de épocas diferentes, esperamos que ambas concordem que se trata de uma mesma cor, o azul. O mesmo acontece em relação a todos os atributos pertencentes às coisas, aos objetos, como a dimensão, o formato, etc.
Mas a mesma concordância não necessariamente ocorre quando perguntamos para duas pessoas se um mesmo objeto é belo ou feio, leve ou pesado. Isso porque, a rigor, nada em si é belo ou feio, leve ou pesado. Belo e feio não são atributos das coisas, mas valores que nós depositamos nas coisas – por elas nos despertarem sensações de certo tipo – quando formulamos acerca delas juízos estéticos. Isso explica duas pessoas formularem juízos estéticos distintos em relação a uma mesma pessoa, situação ou objeto. Isso explica, por exemplo, que as formas arredondadas invejadas das musas renascentistas podem hoje serem mais motivo de repulsa que de modelo estético a ser seguido, ou então que um mesmo quadro possa parecer belo a uma pessoa e feio a outra; ou ainda: que uma mesma música ou estátua possa parecer feia em um determinado momento a uma pessoa e bela – a essa mesma pessoa – em um momento posterior.
Assim como tantos outros objetos de estudo, também a estética corporal pode ser examinada de inúmeras perspectivas diferentes. O fato de o juízo estético ser criação dos indivíduos e das sociedades, isso não deve tornar o exame da estética corporal reducionista a ponto de se levantar a sugestão que ela não mereça análise mais acurada que outras importantes questões sociais. Na medida em que o juízo estético influencia, e muito, a configuração de uma sociedade – na medida em que, como vimos, dita comportamentos, regras sociais, etc –, ele se torna de extrema relevância para a análise social. A análise sociológica da estética corporal assume, então, grande relevância. Na medida em que a estética corporal pode ser um dos determinantes da aceitação do indivíduo para consigo mesmo ou então da sua aceitação para com o restante da sociedade, os valores estéticos referentes ao corpo devem também ser objeto de cuidadosas análises psicológicas. Também vale lembrar da importância de se analisar a estética corporal do ponto de vista da Medicina e de tantas outras perspectivas, como histórica, cultural, etc.
Considerando que a preocupação estética em relação ao corpo é bastante acentuada em nossa sociedade, tendo essa preocupação inúmeras implicações sociais, psicológicas, etc, um sério exame dos 'prós' e 'contras' dessa preocupação e dos modelos estéticos a serem adotados é de grande importância para que a sociedade tenha mais benefícios que prejuízos em relação à preocupação estética com o corpo.
O termo estética é derivado do termo grego aisthetes que, por sua vez, é derivado de aisthesis. O termo aisthesis, assim como outros tantos termos, assume uma pluralidade de significados – fenômeno esse bem comum não apenas à língua portuguesa. Um dos significados de aisthesis é sensação, a ação de sentir. Aisthesis, primeiramente, não possui apelo à racionalidade, mas é um termo para designar a apreensão de um objeto ou de alguma coisa qualquer pelos sentidos. Estética é um termo grego para designar algo para o qual os gregos, em grande medida, voltavam a sua atenção, a saber, para um certo modo de percepção das coisas, dos objetos.
A Filosofia possui uma disciplina denominada Estética, a qual é a disciplina que trata acerca do belo e do feio, uma disciplina que tem como propósito avaliar as obras de arte, atribuindo a elas valores de belo ou de feio. A preocupação com a estética, nesse sentido, é extremamente antiga – os gregos já a possuíam. Ela é própria à Filosofia e não tão-somente ao senso comum. Os gregos, de modo geral e de maneira um tanto acentuada, preocupavam-se com o belo, tanto no que diz respeito às ações – nesse sentido, da perspectiva ética, buscava-se as belas ações –, quanto no concernente à beleza da arquitetura – a respeito da qual tratamos no livro Griffespaços –, ou então no que diz respeito à beleza do corpo. Podemos pensar a estética de várias perspectivas distintas. Cabe, aqui, examiná-la da perspectiva de certa configuração do corpo humano, isto é, da estética corporal, portanto sobre como percebemos – sobretudo através da visão – o corpo, sobre como voltamos o olhar para o corpo.
A preocupação estética com o corpo, similar à preocupação estética de modo geral, também não é uma preocupação tardia, exclusivamente moderna. Os gregos eram cultores do corpo e a prática de se exercitar era uma prática comum, seja para a guerra, em pesados exercícios – como era muito próprio à educação de algumas póleis gregas, sobretudo a espartana –, seja nas academias, visando a boa saúde, seja com finalidade estética. A finalidade estética não era, de modo geral, um fim em si para o grego, mas a preocupação estética visava um fim ulterior, um certo bem viver, pois não passava desapercebido ao olhar do homem grego que o belo é motivador de um certo bem-estar. A preocupação com o corpo, nesse sentido, é primeiramente uma preocupação estética, deslizando para a ética. Por isso a estética do corpo já merece análise cuidadosa quando se trata da Grécia antiga, mas não apenas nesse período e em relação a essa sociedade a preocupação com a análise da estética corporal se faz necessária. Pelos motivos apontados e por diversos outros, a preocupação com a estética corporal é merecedora de cuidadosos estudos também hoje.
Como é comum acontecer, de modo geral, as diversas sociedades, em épocas distintas, adotam certos padrões estéticos, padrões esses muitas vezes determinantes da inserção ou exclusão de algumas pessoas em alguns grupos, da valorização ou discriminação de algumas pessoas, ou até mesmo de um olhar de admiração ou de pena em relação ao outro. Essas determinações podem afetar, e profundamente, o cotidiano de muitas pessoas, determinando rotinas, afazeres, abdicação de prazeres, adoção de comportamentos, até mesmo conduzindo à morte algumas pessoas, como a imprensa brasileira noticiou recentemente casos de meninas que chegaram a falecer ou tiveram graves problemas de saúde por causa de anorexia gerada por excessiva preocupação estética em relação ao corpo.
A análise fria, distante, meramente estética pode nos mostrar que, a rigor, belo e feio não são atributos das coisas, assim como as cores, o formato, as dimensões, o sabor, etc. Isso significa que sobre uma cor, por exemplo o azul – salvo qualquer distúrbio visual, como o daltonismo –, se questionarmos – a respeito de qual cor se trata – duas pessoas, por mais que tenham experiências de vida distintas e sejam de culturas e de épocas diferentes, esperamos que ambas concordem que se trata de uma mesma cor, o azul. O mesmo acontece em relação a todos os atributos pertencentes às coisas, aos objetos, como a dimensão, o formato, etc.
Mas a mesma concordância não necessariamente ocorre quando perguntamos para duas pessoas se um mesmo objeto é belo ou feio, leve ou pesado. Isso porque, a rigor, nada em si é belo ou feio, leve ou pesado. Belo e feio não são atributos das coisas, mas valores que nós depositamos nas coisas – por elas nos despertarem sensações de certo tipo – quando formulamos acerca delas juízos estéticos. Isso explica duas pessoas formularem juízos estéticos distintos em relação a uma mesma pessoa, situação ou objeto. Isso explica, por exemplo, que as formas arredondadas invejadas das musas renascentistas podem hoje serem mais motivo de repulsa que de modelo estético a ser seguido, ou então que um mesmo quadro possa parecer belo a uma pessoa e feio a outra; ou ainda: que uma mesma música ou estátua possa parecer feia em um determinado momento a uma pessoa e bela – a essa mesma pessoa – em um momento posterior.
Assim como tantos outros objetos de estudo, também a estética corporal pode ser examinada de inúmeras perspectivas diferentes. O fato de o juízo estético ser criação dos indivíduos e das sociedades, isso não deve tornar o exame da estética corporal reducionista a ponto de se levantar a sugestão que ela não mereça análise mais acurada que outras importantes questões sociais. Na medida em que o juízo estético influencia, e muito, a configuração de uma sociedade – na medida em que, como vimos, dita comportamentos, regras sociais, etc –, ele se torna de extrema relevância para a análise social. A análise sociológica da estética corporal assume, então, grande relevância. Na medida em que a estética corporal pode ser um dos determinantes da aceitação do indivíduo para consigo mesmo ou então da sua aceitação para com o restante da sociedade, os valores estéticos referentes ao corpo devem também ser objeto de cuidadosas análises psicológicas. Também vale lembrar da importância de se analisar a estética corporal do ponto de vista da Medicina e de tantas outras perspectivas, como histórica, cultural, etc.
Considerando que a preocupação estética em relação ao corpo é bastante acentuada em nossa sociedade, tendo essa preocupação inúmeras implicações sociais, psicológicas, etc, um sério exame dos 'prós' e 'contras' dessa preocupação e dos modelos estéticos a serem adotados é de grande importância para que a sociedade tenha mais benefícios que prejuízos em relação à preocupação estética com o corpo.
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