EQUADOR E SEUS QUATRO MUNDOS

Andréia T. Couto
Em uma pequena porcentagem da superfície terrestre, encontra-se um dos maiores exemplos de diversidade natural do planeta.
Em 2007, a Faculdade Latino-americana e do Caribe de Ciências Sociais – Flacso¹ – completou cinco décadas de atividades relacionadas ao pensamento sobre a realidade da América Latina. Durante cinquenta anos, passaram por sua sede importantes intelectuais, de diversos países do continente, que atuaram em cargos representativos tanto no mundo acadêmico como político. Desde seu surgimento, a Flacso serve como uma possibilidade de encontro, discussão e produção de conhecimento capaz de interferir e fazer uma ponte entre o mundo acadêmico e as práticas políticas. No 50˚ encontro, ocorrido entre outubro e novembro de 2007, o presidente do Equador, Rafael Correa, em seu discurso oficial de abertura, falou para uma platéia de cerca de mil participantes, representantes de vários países da América Latina, Caribe, Espanha e Estados Unidos, da necessidade de integração latino-americana e caribenha, uma aspiração dos povos do continente que vem de longa data. As comemorações em torno do congresso foram também uma oportunidade para mostrar aos participantes estrangeiros esse país ainda pouco conhecido pelos brasileiros, embora suas belezas naturais e históricas sejam muito procuradas por turistas europeus.
A sede Flacso no Equador foi estabelecida em 1974 na cidade de Quito, capital do país, que fica a 2850 m de altitude, em meio à Cordilheira dos Andes e ladeada pela imponente montanha de Pichincha. A origem da capital é pré-colombiana e quando os espanhóis chegaram à região, em 1526, o lugar era habitado pelos quitus, que se uniram com os shyris e juntos, mais tarde, lutaram contra os incas no final do século XV. Estes últimos dominaram a região até a época da conquista espanhola. Apesar de a cidade estar localizada a apenas 22 quilômetros ao sul do Equador, sua altitude permite um clima primaveril ao longo de todo o ano. No Parque Nacional Cotopaxi, a cinquenta quilômetros da capital, é possível observar o cume do vulcão com o mesmo nome coberto de neve em pleno verão, assim como o topo de outras montanhas próximas ao parque.
O país é pluricultural, mesclando formas de manifestações culturais dos povos andinos a manifestações de fervoroso catolicismo, expresso em majestosos monumentos religiosos, como a Igresia San Francisco, a Iglesia de la Catedral, erigida como Iglesia Mayor, ambas do século XVI, a Capilla de San Buena, conhecida também como a Capilla de la Vera Cruz de los Españoles, do século XVII. Um passeio pelo centro histórico, tombado pela UNESCO, a partir da Plaza de San Francisco, conduz a uma série de monumentos que fazem parte do acervo do Patrimônio da Humanidade, um dos mais importantes da América Latina. Além das belíssimas igrejas seiscentistas, estão os palácios governamentais, seminários, conventos, além do casario que compõe o «centro velho» de Quito.
O sincretismo religioso aparece de maneira mais forte durante as diversas comemorações ao longo do ano. As festas populares celebradas, muitas são de origem católica, embora mescladas com aspectos guardados de povos pré-colombianos, como as festas da colheita (Fiesta de la Yuca), realizada pelos záparos e quíchuas orientais, na selva amazônica equatoriana, entre janeiro e março. Há também os desfiles indígenas, realizados perto de Riobamba; a festa do vale do rio Chota (há também a comemoração da Chonta, um fruto amazônico com o qual os indígenas pintam o corpo; com a polpa da mesma fruta fermentada, produzem uma bebida com suave teor alcoólico), em cuja celebração a população afro equatoriana toca um ritmo chamado bomba, com instrumentos musicais como o «puro» e a «calabaza», o «cogollo de cabuya», enquanto os participantes bebem uma aguardente chamada Caldera; a festividade de Kasama (nova vida), realizada pelas comunidades de tsáchilas, em Santo Domingo de los Colorados, em Pichincha. Nessa festa, que coincide com o sábado da Semana Santa, os indígenas se banham nas águas do rio antes do amanhecer. Durante a festa, os músicos tocam a «marimba», cantam em sua língua, comem e bebem yuca e caña. Essas festas tradicionais convivem com os festejos católicos, como as de Reis, Semana Santa, Corpus Christi, Finados, a dos ritos católicos de agradecimentos a algum santo pelo fim das colheitas, no final de junho, como a de Los Sanjuanes, realizada pelos índios otavaleños.
Paralelamente à «cidade velha» e aos povos que ainda guardam seus costumes mais autênticos, encontra-se ao norte a Quito moderna, a parte da cidade onde estão os edifícios novos, a parte administrativa, os grandes hotéis, restaurantes e bares que mostram o lado cosmopolita da cidade. O bairro mais característico nesse sentido é o Mariscal Sucre, por cujas ruas estreitas nos fins de semana circulam pessoas em busca de dança, modernos e aconchegantes cafés, restaurantes típicos ou internacionais, ou simplesmente circulam e admiram a diversidade.
O Equador, embora pequeno, merece ser visitado com uma boa disposição de tempo, pois é dividido em quatro regiões distintas, Galápagos, a Costa, os Andes e a Amazônia, cada qual com suas particularidades. De superfície reduzida, é um dos países de maior diversidade geográfica e cultural do planeta. À parte Quito, onde o visitante pode gastar uma parte considerável do seu tempo entre as ofertas históricas, culturais e gastronômicas, Galápagos deve ser visto com outra reserva de tempo, pois oferece um tipo de cenário completamente diferente. Desconhecido até 1535, foi abrigo de bucaneiros, caçadores de focas e baleias e cenário para Darwin levar adiante sua teoria da evolução. Protegido como reserva natural e santuário de vida selvagem desde 1959, o arquipélago tem um turismo controlado. Ainda assim, o número de hotéis e turistas vem crescendo rapidamente, a ponto de o governo equatoriano ter que intervir a respeito de grandes projetos para a construção de luxuosos hotéis que acabariam por causar impactos no frágil equilíbrio ecológico do arquipélago. A distância de mil quilômetros do continente é também um dos fatores que encarece o turismo para as ilhas.
Os distintos cenários, oferecidos pelas quatro diferentes regiões do Equador, fazem deste pequeno país um exemplo de diversidade, um patrimônio natural onde a vida pode ser contemplada em seu estado mais puro.
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¹A Flacso é um organismo internacional que surgiu em 1956 na Conferencia Geral da Unesco, cuja intenção original era dar apoio aos países da América Latina na criação de uma entidade de ciências sociais que gerasse um espaço de reflexão impulsionando o desenvolvimento das sociedades. Para mais informações, acesse www.flacso.org.ec.
(*) Professora dos cursos de Letras e Jornalismo da Universidade Paulista – UNIP.
Em uma pequena porcentagem da superfície terrestre, encontra-se um dos maiores exemplos de diversidade natural do planeta.
Em 2007, a Faculdade Latino-americana e do Caribe de Ciências Sociais – Flacso¹ – completou cinco décadas de atividades relacionadas ao pensamento sobre a realidade da América Latina. Durante cinquenta anos, passaram por sua sede importantes intelectuais, de diversos países do continente, que atuaram em cargos representativos tanto no mundo acadêmico como político. Desde seu surgimento, a Flacso serve como uma possibilidade de encontro, discussão e produção de conhecimento capaz de interferir e fazer uma ponte entre o mundo acadêmico e as práticas políticas. No 50˚ encontro, ocorrido entre outubro e novembro de 2007, o presidente do Equador, Rafael Correa, em seu discurso oficial de abertura, falou para uma platéia de cerca de mil participantes, representantes de vários países da América Latina, Caribe, Espanha e Estados Unidos, da necessidade de integração latino-americana e caribenha, uma aspiração dos povos do continente que vem de longa data. As comemorações em torno do congresso foram também uma oportunidade para mostrar aos participantes estrangeiros esse país ainda pouco conhecido pelos brasileiros, embora suas belezas naturais e históricas sejam muito procuradas por turistas europeus.
A sede Flacso no Equador foi estabelecida em 1974 na cidade de Quito, capital do país, que fica a 2850 m de altitude, em meio à Cordilheira dos Andes e ladeada pela imponente montanha de Pichincha. A origem da capital é pré-colombiana e quando os espanhóis chegaram à região, em 1526, o lugar era habitado pelos quitus, que se uniram com os shyris e juntos, mais tarde, lutaram contra os incas no final do século XV. Estes últimos dominaram a região até a época da conquista espanhola. Apesar de a cidade estar localizada a apenas 22 quilômetros ao sul do Equador, sua altitude permite um clima primaveril ao longo de todo o ano. No Parque Nacional Cotopaxi, a cinquenta quilômetros da capital, é possível observar o cume do vulcão com o mesmo nome coberto de neve em pleno verão, assim como o topo de outras montanhas próximas ao parque.
O país é pluricultural, mesclando formas de manifestações culturais dos povos andinos a manifestações de fervoroso catolicismo, expresso em majestosos monumentos religiosos, como a Igresia San Francisco, a Iglesia de la Catedral, erigida como Iglesia Mayor, ambas do século XVI, a Capilla de San Buena, conhecida também como a Capilla de la Vera Cruz de los Españoles, do século XVII. Um passeio pelo centro histórico, tombado pela UNESCO, a partir da Plaza de San Francisco, conduz a uma série de monumentos que fazem parte do acervo do Patrimônio da Humanidade, um dos mais importantes da América Latina. Além das belíssimas igrejas seiscentistas, estão os palácios governamentais, seminários, conventos, além do casario que compõe o «centro velho» de Quito.
O sincretismo religioso aparece de maneira mais forte durante as diversas comemorações ao longo do ano. As festas populares celebradas, muitas são de origem católica, embora mescladas com aspectos guardados de povos pré-colombianos, como as festas da colheita (Fiesta de la Yuca), realizada pelos záparos e quíchuas orientais, na selva amazônica equatoriana, entre janeiro e março. Há também os desfiles indígenas, realizados perto de Riobamba; a festa do vale do rio Chota (há também a comemoração da Chonta, um fruto amazônico com o qual os indígenas pintam o corpo; com a polpa da mesma fruta fermentada, produzem uma bebida com suave teor alcoólico), em cuja celebração a população afro equatoriana toca um ritmo chamado bomba, com instrumentos musicais como o «puro» e a «calabaza», o «cogollo de cabuya», enquanto os participantes bebem uma aguardente chamada Caldera; a festividade de Kasama (nova vida), realizada pelas comunidades de tsáchilas, em Santo Domingo de los Colorados, em Pichincha. Nessa festa, que coincide com o sábado da Semana Santa, os indígenas se banham nas águas do rio antes do amanhecer. Durante a festa, os músicos tocam a «marimba», cantam em sua língua, comem e bebem yuca e caña. Essas festas tradicionais convivem com os festejos católicos, como as de Reis, Semana Santa, Corpus Christi, Finados, a dos ritos católicos de agradecimentos a algum santo pelo fim das colheitas, no final de junho, como a de Los Sanjuanes, realizada pelos índios otavaleños.
Paralelamente à «cidade velha» e aos povos que ainda guardam seus costumes mais autênticos, encontra-se ao norte a Quito moderna, a parte da cidade onde estão os edifícios novos, a parte administrativa, os grandes hotéis, restaurantes e bares que mostram o lado cosmopolita da cidade. O bairro mais característico nesse sentido é o Mariscal Sucre, por cujas ruas estreitas nos fins de semana circulam pessoas em busca de dança, modernos e aconchegantes cafés, restaurantes típicos ou internacionais, ou simplesmente circulam e admiram a diversidade.
O Equador, embora pequeno, merece ser visitado com uma boa disposição de tempo, pois é dividido em quatro regiões distintas, Galápagos, a Costa, os Andes e a Amazônia, cada qual com suas particularidades. De superfície reduzida, é um dos países de maior diversidade geográfica e cultural do planeta. À parte Quito, onde o visitante pode gastar uma parte considerável do seu tempo entre as ofertas históricas, culturais e gastronômicas, Galápagos deve ser visto com outra reserva de tempo, pois oferece um tipo de cenário completamente diferente. Desconhecido até 1535, foi abrigo de bucaneiros, caçadores de focas e baleias e cenário para Darwin levar adiante sua teoria da evolução. Protegido como reserva natural e santuário de vida selvagem desde 1959, o arquipélago tem um turismo controlado. Ainda assim, o número de hotéis e turistas vem crescendo rapidamente, a ponto de o governo equatoriano ter que intervir a respeito de grandes projetos para a construção de luxuosos hotéis que acabariam por causar impactos no frágil equilíbrio ecológico do arquipélago. A distância de mil quilômetros do continente é também um dos fatores que encarece o turismo para as ilhas.
Os distintos cenários, oferecidos pelas quatro diferentes regiões do Equador, fazem deste pequeno país um exemplo de diversidade, um patrimônio natural onde a vida pode ser contemplada em seu estado mais puro.
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¹A Flacso é um organismo internacional que surgiu em 1956 na Conferencia Geral da Unesco, cuja intenção original era dar apoio aos países da América Latina na criação de uma entidade de ciências sociais que gerasse um espaço de reflexão impulsionando o desenvolvimento das sociedades. Para mais informações, acesse www.flacso.org.ec.
(*) Professora dos cursos de Letras e Jornalismo da Universidade Paulista – UNIP.
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