DESCONSTRUINDO O MASP
Flavio F. A. Andrade
Uma proposta de recuperação foi reprovada em 2005 pelo Conpresp. O órgão que deveria preservar, ironicamente ajudou a destruir mais um cartão postal no Brasil. O recente roubo dos quadros de Cândido Portinari e Pablo Picasso reflete a crise vivida pelo museu há anos.
Duas semanas depois de visitar o maior e mais importante museu de São Paulo, o MASP, fico sabendo da notícia do roubo de duas importantes obras. O Museu, localizado na avenida Paulista, em São Paulo, foi assaltado no mês de dezembro passado por uma quadrilha especializada: três pessoas, em apenas três minutos, levaram duas das mais importantes obras do acervo: O Lavrador de Café, de Cândido Portinari, e O Retrato de Suzanne Bloch, de Pablo Picasso. As obras, juntas, são avaliadas em 55 milhões de dólares. Um mês depois, em janeiro de 2008, os quadros foram recuperados. A reputação do MASP ainda não.
O roubo reflete a crise em que o museu se encontra. A perda seria enorme para a instituição, já que o museu não possui um seguro específico para suas obras de arte. Fato que piora ainda mais a imagem do MASP, já antes arranhada por consecutivas crises financeiras.
É estranho pensar na morte deste importante museu, mas ela pode estar próxima, e tendo a ajuda de instituições que deveriam preservá-lo.
Assaltos acontecem em qualquer museu, mesmo em países de 1º mundo. Mas as circunstâncias deste assalto nos remetem à falta de verba para a segurança, dita precária por muitos especialistas. O que contribuiu para este roubo foi o fato de o museu não ter dinheiro para investir em segurança básica. Na ocasião, apenas três vigias faziam a ronda noturna. O sistema de câmera do circuito interno era precário.
É triste levar amigos que moram em outros países para visitar este museu. O prédio está todo em pedaços por fora. Literalmente feio, descuidado, desbotado. Foi doloroso ter que ouvir os comentários de um amigo quando lá estávamos para conhecer de perto um dos maiores símbolos de São Paulo. Na hora não pude encontrar argumentos para justificar o descaso com uma obra arquitetônica tão importante.
A única coisa que conseguia pensar quando andava debaixo do vão deste edifício era na proposta de recuperação feita por Adib Jatene. O MASP planejava sair da crise construindo uma torre com mirante no prédio ao lado, mas o projeto foi vetado em 2005 pelo Conpresp (Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental), órgão da prefeitura responsável pelo patrimônio histórico. De acordo com o Conpresp, «a construção da torre interferiria no MASP a ponto de descaracterizar o prédio do museu.»
O projeto do arquiteto, e presidente do MASP há dez anos, Júlio Neves, era construir uma torre com 125 metros de altura que teria como base o edifício Dumont-Adams, em ruínas. O topo abrigaria um cybercafé e um mirante para visitação turística. O patrocínio viria da operadora de celular Vivo, que comprou o prédio para o museu por R$ 12 milhões. O plano da operadora era colocar seu logotipo no alto da torre, com os dizeres: «MASP VIVO». Seria cobrada uma taxa para a visitação que ajudaria na manutenção do MASP.
Os críticos dizem que a torre interferiria nas «áreas envoltórias» do museu. O grande problema aqui é que o MASP é tombado por órgãos do patrimônio histórico: Iphan (federal), Condephaat (estadual) e Conpresp (municipal). Por causa deste tombamento que não protege, pelo contrário, o prejudica, qualquer obra vizinha precisa ser aprovada. Na ocasião do veto do projeto, apenas a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) no conselho, votou favorável.
A torre seria hoje a salvação do museu. Não afetaria em nada o prédio projetado em 1958 pela arquiteta Lina Bo Bardi. A construção não acarretaria um desequilíbrio na paisagem como foi erroneamente sugerido. E também não competiria com o museu. O argumento de que enfraqueceria ambos os edifícios não se justifica, pois o motivo pelo qual seria construído tiraria este estigma em pouco tempo. A paisagem se complementaria. Ambos, museu e torre, servindo para o mesmo propósito: o turismo. A torre seria uma extensão do museu. O MASP passaria por uma reforma, e ganharia um mastro. É muito fácil integrar os dois edifícios e transformá-los em um. A torre seria um braço que se elevaria ao céu.
O projeto inicial da torre poderia ter falhas estéticas, como foi dito, mas mesmo Júlio Neves propondo uma remodelação ou um «concurso fechado, conduzido pelo presidente do museu, para escolher um novo projeto para a torre», a proposta foi recusada. O museu perdeu um braço, que o tiraria da crise, e aos poucos vai perdendo sua pernas, sua face. Já não mais o reconhecemos.
Sem torre e sem turistas, o fim do Museu pode estar bem próximo. O Conpresp vetou não apenas a construção de uma torre, mas a continuação da vida do Museu. Sobre a argumentação de que a construção da torre traria prejuízos estéticos a ambos, impediram a salvação de um dos maiores símbolos do Brasil.
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