É preciso ver de novo


MARCELA MORO*

“É preciso ver o que não foi visto, ver outra vez o que se viu já, ver na primavera o que se vira no verão, ver de dia o que se viu de noite, com sol onde primeiramente a chuva caía, ver a seara verde, o fruto maduro, a pedra que mudou de lugar, a sombra que aqui não estava. É preciso voltar aos passos que foram dados, para os repetir. E para traçar caminhos novos ao lado deles.”
José Saramago
Viagem a Portugal


José Saramago nos convida a ver de novo, a ver por outras óticas, a aguçar a visão para ver aquilo que sempre esteve ali, mas que, muitas vezes, não mais vemos.
Todos os dias pelos mesmos trajetos, as mesmas ruas, “as mesmas praças, as mesmas flores, os mesmos jardins” já cantava a velha música. Desaprendemos a ver e com isso, deixamos de olhar. Desaprendemos aquele olhar que vê a beleza, ou simplesmente, não mais vemos e assim, não mais olhamos.
Mas José Saramago nos convida a ver de novo. Ver de novo? Olhar de novo? Sim, olhar com olhos mais abertos, para ver! Olhar sem preconceitos, olhar diferente, um olhar puro, filtrado. Muita vezes, para vermos a verdadeira beleza, precisamos deste olhar, quase inocente, quase infantil!
Nossa cultura, nosso dia-a-dia nos ensina a ver e direciona nosso olhar, condiciona o que vemos e o que admiramos! E passamos a olhar tal como tudo nos guia. Olhar somente o que é apresentado, para ver o que é belo, não de acordo com o que pensamos, mas com o que está na TV, no rádio, nas páginas da internet, nas capas das revistas.
Então, olhamos com o olhar do outro, que direciona! Vemos o que o outro quer! Olhamos com olhar que a lógica do mercado e do consumo quer que olhemos! E vemos o que esta mesma lógica deseja!
Precisamos reaprender a olhar! Precisamos ver de novo!
E reaprender a olhar requer o olhar de novo! O olhar que procura a beleza naquilo que simplesmente está ali, todos os dias! Mesmo a mais bela paisagem, se vista todos os dias, perde seu encantamento. E é por isso que convidamos a olhar, de novo.
Nossa cidade está aí todos os dias! Suas ruas, suas praças, seus monumentos, sua história! Seus encantos escondidos nas esquinas, nas casas, em uma arquitetura que é só sua!
A beleza está oculta neste centro velho, movimentado, de ruas estreitas e de prédios antigos. A beleza da cidade está em suas árvores, em suas paisagens, em suas pessoas. Em estar esparramada aos pés de um monumento tão lindo como aquele que está ali, a bela serra, verde, imponente, misteriosa!
A beleza está nos rostos, nos sorrisos dos mais antigos, ou nas brincadeiras marotas dos mais jovens!
A beleza está nas festas, nas risadas, na música, na gastronomia tão rica e tão tradicional! A beleza, a verdadeira beleza, está nos detalhes!
Olhe de novo, para ver! Uma cidade bela vai brotando, vai nascendo em nosso olhar, agora, purificado!
É esta cidade que este forasteiro, conhecido como turista, vê!
É este olhar que aquele que vem de fora traz consigo! É este o motivo que faz com que o forasteiro – turista, veja tanta beleza, tanta alegria, naquelas paisagens que, para nós, são somente o retrato – estático – do cotidiano!
Pois este novo olhar é movimento! É energia! E é esta energia que encanta e apaixona! É este olhar que devemos fazer brotar em nós mesmos!
Precisamos reaprender a olhar, para ver! Precisamos olhar com carinho, para a cidade que também, em suas curvas, conta um pouco da nossa história!
Precisamos olhar de novo para esta cidade, Jundiaí, que carrega em si encantos, sabores e cores que só estão aqui. Para esta cidade que conta um pouco da história de São Paulo, que conta a saga do imigrante e de um povo trabalhador.
Jundiaí também traz em si a história do ferroviário, da antiga estação e suas oficinas, de arquitetura bela e imponente, da ferrovia que mudou os rumos do Estado e do País, e também dessa cidade, meio interiorana, mas com ares modernos, meio caipira e rural mas também urbana, às vezes antiga e tradicional, e por vezes cidade de ponta.
É essa bela Jundiaí que precisamos olhar de novo. Precisamos olhar para a terra da uva! Sim, Jundiaí é ainda uma grande produtora de uvas de mesa e de outras frutas. Frutas estas que podem ser colhidas no pé, depois de um café da manhã caipira, em uma visita por nossos roteiros rurais, de aromas, cores e sabores irresistíveis.
Sabores estes ainda complementados pelo aroma dos vinhos, das tantas adegas espalhadas pela cidade, muitas delas ainda fazendo seu vinho à moda antiga, como aprenderam com seus avós, que aqui chegaram para trabalhar e que iniciaram o cultivo das uvas.
Mas nossa cidade não é só isso! Jundiaí é também uma cidade verde, arborizada, uma cidade em que o tempo passa calmo, se você puder parar por um minuto, simplesmente para olhar.
Então, olhe de novo, para ver! Mas olhe com o carinho daquele que ama sua terra, pois aquele que ama, conhece as limitações, mas vê a beleza, vê a alegria, vê as cores! Aquele que ama olha e olha de novo! Olha sempre pois vê o que é verdadeiramente belo e autêntico!
Saramago convidou a ver de novo, então, vamos olhar novamente para esta bela e encantadora cidade, para que ela, além dos forasteiros – que freqüentemente a adotam – também faça apaixonar aqueles que cruzam suas ruas, todos os dias!

(*) Marcela Moro - Bacharel em Turismo e Mestre em Comunicação. É a atual Presidente do Conselho Municipal de Turismo de Jundiaí.

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