THE LAST SLICE OF TOMATO


Reinaldo Reigrimar

Hambúrguer de duas carnes, uma folha de alface e duas fatias de tomate. Não gostei do tomate. Era o último pedaço do legume que tanto gosto. Mas tudo bem, isso não fez a menor diferença, pois estava ali, pronto para conhecer o Velho Mundo. Com malas na mão e esperança de que tudo desse certo no vôo da KLM. Ao chegar no aeroporto de Guarulhos para fazer o check in, perguntei onde ficava o guichê da KLB. Não sou fã do grupo pop brasileiro, mas foi o que me veio a cabeça. A aeromoça a quem perguntei tal absurdo deu um sorriso com graça e disse: “KLB não, KLM.” E eu meio sem graça: “Ah! KLM.” Vermelho e rindo por dentro, me lembrei da condição de marinheiro de primeira viagem. No check in: “Onde você quer ir no avião, na janela, no meio ou no corredor?” E eu pensando que avião é ônibus. Fui logo pedindo a janela. Não sabia que iria na tangente da ensurdecedora turbina e vendo a asa em seu recuo de aerodinâmica. Logo na decolagem pensei que a asa acabara de se partir ao meio. Com o tempo descobri que aquela manobra é comum na decolagem e na aterrissagem, mas antes meu coração foi a mil pensando que aquele seria mais um noticiário de tragédia no mundo. Não, era só o começo da virtude de ver as coisas com outros olhos. Outros países, outras línguas, muitas culturas. Finalmente, depois de quase 30 horas de “pé na estrada”, cheguei ao destino. Depois de ter conhecido um pouco de Amsterdã, já estava no Norte da França. Tudo maravilhoso. Não tem a torre nem o arco, nem o Sena, mas tem todo aquele glamour de país de 1º mundo. “Bonjú”, “arrevuá”. Que bela expressão. Que belos olhos daquela moça na esquina. Pensando eu que o Brasil é um país de migrantes. Tantos muçulmanos! Alá rogai por mim, não é preconceito, mas onde vão estas pessoas vestidas assim, pensei. Um banho de cultura, com alvejante e tudo. O berço de tudo estava ali no século 21, onde guerras históricas já foram papéis de parede daquele país. As estátuas contam tudo: não é preciso guia. Os olhos vêem a liberdade de um povo que tem história pra contar. História como a de meu avô que era de extrema esquerda. Quando “estourou” o golpe de 64 no Brasil, o país em total crise, teve que se arrastar por trilhos numa distância de seis quilômetros. As balas cortavam o céu, as ruas e becos de Ipatinga, cidade natal. Poderia eu também esbarrar em parentes distantes, “paternamente” falando. Minha tataravó era francesa. Foi para o Brasil fugindo de uma negra e epidêmica peste que assolava a França. História à parte, descobri que país de 1º mundo também tem Fusca, tem Fiat Uno. Estou numa aldeia globalizada, onde o “lixo” é um mal de 3º mundo. Foi ainda ontem, na 7º série, que a professora na aula de geografia me falava da construção da “década”. Um canal que ligaria dois países (França e Inglaterra), passando debaixo do Oceano. A professora, com todo aquele tom de ilusão e distância de nossa realidade. Não sabia eu que mais tarde estaria atravessando o Canal da Mancha. Cheguei em Londres, a Capital da Música Mundial, berço dos Beatles e Rolling Tones. Onde fabricam as melhores guitarras do mundo. Estou eu na realidade da Monarquia Inglesa. País das mais diversas raças. Aqui os negros discriminam os brancos. No Baixo eles são a maioria. Londres é um bom lugar. Só tome cuidado ao atravessar a rua. Tudo ao contrário. Vejo um homem pedindo esmola, dois, três... Nossa! Parece que estou no Brasil. Aquele homem engravatado gritando em praça pública seria um pastor? Pareceu que sim, ouvi muitos God, God... one seven one (171)! Aqui também? Vejo Ferrari, vejo Limusine, Porsche. Na TV um Jogo de futebol onde brasileiros são idolatrados. Ah, a nacionalidade! Estou aqui com sentimentos gloriosos de saudade. Se falo isso eles não entendem. Estou com saudade do sol, do banheiro, do chuveiro e da conversa demorada. Da calçada, da calça apertada, da menina feia que aqui se torna linda. Saudade da mãe, dos amigos, da televisão e dos jornais. Estou com saudade daquele sanduíche com duas carnes, uma folha de alface e duas “fatias” de tomate, que eu não tinha gostado.

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