RELAÇÕES CONFLITUOSAS

FÁBIO PORTUGAL

O fato de estar escondido atrás de uma tela de computador encoraja o ser humano a fazer o que sempre teve vontade? Ou serve apenas como uma espécie de experimento para saber qual seria a reação da sociedade perante seu novo comportamento?
Para milhares de internautas parece que a alternativa mais correta é a de que se trata muito mais de uma exclamação de seus pensamentos reprimidos por uma sociedade supostamente hipócrita. E é exatamente por isso que a expressão fake se tornou comum para os usuários do Orkut. Fake designa aquele perfil feito por qualquer pessoa travestindo alguma personalidade, ou às vezes nem isso, bastando apenas ser algo extremamente bizarro.
Esses milhares de internautas criam diariamente outros milhares de perfis obscuros. Entre os que assumem a dupla personalidade, muitos reconhecem possuir uma vida considerada normal. Trabalham, estudam, namoram, e justamente por isso sentem medo de exprimir o que pensam perante amigos, familiares e colegas de trabalho.
Não havendo necessidade da exposição e julgamento de terceiros, o lado mais obscuro, mesmo que certas vezes exagerado, acaba sendo por muitas vezes mais verdadeiro do que o “original”. Quase a totalidade dessas outras faces se dedica a sexualidade e apologia às drogas. Exatamente por isso é muito difícil encontrar alguém que fale abertamente sobre sua dupla personalidade, já que o objetivo é justamente o anonimato. Mas o consenso geral é o de que não fazem isso porque querem. Esse fenômeno é encarando muito mais como uma “obrigação”, pois, segundo eles próprios, o culpado por esse fenômeno não são eles, e sim a enorme hipocrisia da sociedade que os ronda.
Tratando-se de um mundo virtual, onde todos podem expressar sua opinião com a segurança de um anonimato, fica muito difícil traçar um perfil do que realmente leva uma pessoa a esse conflito consigo mesma. Anônimo ou não, suas convicções ficarão de qualquer maneira armazenadas em sua consciência, tranqüila ou não, e poderá revelá-las ao mundo, se quiser ou não, para que assim suas personalidades possam viver harmoniosamente. Ou não, claro.

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